O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, declarou ao Supremo Tribunal Federal que presenciou reuniões em que se discutia uma proposta para anular as eleições presidenciais de 2022. Segundo ele, o então presidente leu uma minuta de decreto com medidas autoritárias e sugeriu alterações. O documento previa a prisão de autoridades dos poderes Judiciário e Legislativo, além da criação de uma nova comissão eleitoral.
Pontos Principais:
Em seu depoimento, Cid afirmou que não foi coagido a colaborar com a Polícia Federal e que assinou espontaneamente o acordo de delação premiada. Ao ser questionado pelo ministro Alexandre de Moraes, ele confirmou que Bolsonaro não só teve acesso à minuta do golpe como fez mudanças no texto, excluindo a prisão de várias autoridades e mantendo apenas a de Moraes, que presidia o TSE na ocasião.
O militar descreveu que o texto era dividido em três partes, sendo a primeira formada por considerandos que criticavam interferências do STF e do TSE no processo eleitoral. A segunda parte tratava de dispositivos jurídicos como estado de defesa e estado de sítio, e também propunha um novo pleito. Já a terceira parte continha a minuta do decreto em si, a ser editado por Bolsonaro com o apoio das Forças Armadas.
Ainda segundo Cid, ao menos duas ou três reuniões foram realizadas com a presença do presidente para tratar da proposta. Ele declarou que Bolsonaro “enxugou” o conteúdo da minuta, retirando menções mais amplas à prisão de ministros e limitando a ação ao relator das investigações. A intenção, de acordo com o depoente, era criar uma justificativa legal para invalidar o resultado das urnas e conduzir uma nova eleição.
A delação de Cid reforça a tese da Procuradoria-Geral da República, que aponta a existência de um núcleo central no governo voltado à ruptura institucional. Os acusados são investigados por tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa, dano qualificado e destruição de patrimônio tombado. Bolsonaro será um dos últimos a ser ouvido.
Além de Bolsonaro, outros seis nomes serão interrogados ao longo da semana, incluindo os generais Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, o ex-ministro Anderson Torres e o deputado Alexandre Ramagem. Todos fazem parte do núcleo político-militar mencionado na denúncia. A audiência marca a primeira vez em que o conjunto de réus responde diretamente à mais alta corte do país sobre a tentativa de subverter o processo democrático.
Ao detalhar seu papel na trama, Cid se apresentou como alguém com baixa autonomia nas decisões e que apenas repassava instruções vindas do presidente. Também confirmou o uso de mensagens com outros militares e até hackers para tentar desacreditar o processo eleitoral. Apesar de minimizar sua atuação, ele foi enfático ao declarar: “Presenciei grande parte dos fatos”. A frase se tornou o ponto central do depoimento no STF.