A evolução no setor automobilístico que temos acompanhado nos últimos anos é colossal, especialmente no que respeita ao aspecto tecnológico. Ao par disso, existe um grande impasse entre as montadoras: como integrar tantas mudanças em tão pouco tempo. No mercado brasileiro esses avanços poderão ser praticados? A partir de quando? Entenda um pouco mais sobre o que está acontecendo com a indústria automobilística.
O Brasil passou – e de certa forma ainda passa – por uma enorme crise, especialmente entre os anos de 2014 e 2017, e agora começa a se erguer. Não vamos tratar aqui da crise, dos seus motivos ou dos culpados. O fato concreto é que ela aconteceu e afetou inúmeros setores da sociedade, e um dos mais atingidos foi o setor automobilístico, o qual começa agora a crescer timidamente em relação aos anos anteriores.
Em janeiro de 2019 o número de carros 0km vendidos foi de 199.800, a melhor cifra desde 2015. O número representou um aumento de 10% em relação a janeiro de 2018, mas ainda falta muito para a indústria se ver a salvo e deixar de ser complicado comprar carro no Brasil.
O setor voltou a crescer, entre outras coisas, porque a crise financeira regrediu e a situação geral do país melhorou, fazendo com que as pessoas tenham menos receio de assumir um compromisso financeiro com veículo.
Outro sinal de que a crise recuou é a venda de caminhões no país, que aumentou em 50% comparado janeiro de 2018 e janeiro de 2019. Isso reflete o crescimento do PIB, pois quando o mercado está bom os transportes aumentam. Durante a crise o setor de caminhões chegou a 70% de ociosidade.
Isso mostra que a economia está voltando a se aquecer. Outro exemplo disso é o aumento nas vendas de motocicletas, especialmente aquelas de uso para trabalho. Os bancos estão liberando crédito para a compra desses veículos com mais facilidade, lembrando que boa parte desse público muitas vezes não conseguem comprovar a renda. O que há dois anos eram 3 aprovações para 10 pedidos de financiamento, hoje é de 6 para 10.
Estima-se que a indústria automobilística hoje representa 4% do PIB nacional. Parece pouco, mas se colocarmos na balança os empregos que giram em torno do setor, não apenas na indústria que o fabrica, mas também os outros serviços, como as concessionárias, as oficinas, os fabricantes de peças, postos de combustível, pedágios e quantos outros, o impacto é muito grande, existe toda uma cadeia enorme envolvida.
Só a venda de veículos usados foi de mais de 700 mil unidades em janeiro de 2019. Aqui estamos falando de uma enorme movimentação de dinheiro e um grande número de pessoas envolvidas, sem falar nas taxas arrecadadas.
Os novos desafios tecnológicos constituem uma barreira que está obrigando as montadoras unirem esforços, do contrário, não será possível dar conta da demanda e das atualizações que o mercado está impondo. Por exemplo a Ford e a Volkswagen recentemente anunciaram um esforço conjunto para a fabricação de alguns modelos, com vistas a andarem mais depressa com a tecnologia e cortarem custos.
Cada vez mais as montadoras precisam se agrupar e fazer parcerias com empresas de alta tecnologia, sob risco de desaparecerem no horizonte das novas descobertas. Poderá acontecer com elas algo semelhante ao que aconteceu quando surgiram os CD’s e as locadoras de vídeos em VHS não correram pra se atualizar, agora são apenas recordações da nossa juventude.
Tudo isso vai gerar uma mudança muito grande nas linhas de montagem, empregos vão ser suprimidos pela robotização. Estamos vendo agora o caso Chevrolet, que tem o líder de vendas nas mãos mas ameaçando sua saída do Brasil. O Onix, embora com muito sucesso nas vendas, não é um modelo que traga um grande retorno para a marca, pois é um carro popular e de valor baixo. Mas no fundo tudo isso faz parte de um processo de renovação que estamos prestes a ver.
A incerteza é uma das piores sensações pelas quais o ser humano pode passar. Não saber o que vai acontecer amanhã pode ser assustador. As dúvidas sobre o futuro do setor automobilístico, entretanto, não são tão cruéis, o caminho já está delineado. A grande questão é “quando” esses planos se tornarão realidade, se bem que certa forma já são, ao menos em alguns países mais desenvolvidos.
É por isso que, sem hesitar, especialistas dizem que os acontecimentos dos próximos 5 anos, máximo 10 anos, serão mais relevantes para o automobilismo, do que os 50 anos que deixamos para trás. Isso se comprova facilmente sem que precisemos ir muito longe. O Park Assist, sistema que estaciona o carro sozinho, era impensável para carros “populares” há poucos anos. Hoje eles já são uma realidade, especialmente nos EUA e na Europa.
Carros elétricos também são uma realidade bastante recente e também difícil de acreditar há uma década ou duas. O próximo item da lista é o carro autônomo, que não precisará mais de intervenção humana para condução, mas apenas da orientação de destino. Isso transformará completamente o conceito de carro.
Não haverá mais a necessidade de manter a disposição de assentos como temos hoje na maioria dos veículos, ou seja, 2 na frente e 3 atrás. Todos poderão viajar tranquilamente em torno de uma mesa fazendo uma reunião ou jogando cartas, bebendo e conversando, tanto faz. As portas não precisarão manter as características que vemos hoje, bastará uma única porta de correr por onde todos entrarão.
A grande questão do “quando” não é tanto referente às montadoras, as quais já dedicam muito dinheiro e tempo no desenvolvimento do sistema autônomo em cada um de seus estágios, mas sim da estrutura para receber esse tipo de veículo.
Hoje os carros já contam com diversos recursos tecnológicos que vão se aproximando da autonomia, por exemplo o Assistente de Faixa, sistema capaz de identificar a faixa de rodagem e corrigir a direção do veículo na via, mesmo sem a intervenção do motorista. Mas para que serve esse recurso se as faixas não estão pintadas nas ruas?
Quando os carros autônomos estiverem circulando, precisarão ter uma comunicação com outros veículos, com o sistema de sinalização, semáforos inteligentes e muitos outros elementos. Como esperar que o Brasil, diante do que temos hoje, oferecerá possibilidade para substituição de todos os semáforos, se os que temos mal funcionam?
Em outras palavras, a evolução do carro não dependerá mais apenas das montadoras, mas de toda estrutura de uma cidade, de um estado, de um país, da conscientização do Poder Público e autoridades competentes.
Com a situação financeira catastrófica em que a maior parte dos estados se encontram, de onde virá o dinheiro para instalação de semáforo inteligente, por exemplo? Ou então para a adequação da pavimentação das vias?
O mesmo se diga em relação ao carro elétrico. A falta de estrutura e também a falta incentivo financeiro e fiscal para sua aquisição no país inibe as próprias montadoras de investirem em modelos que terão pouca saída por causa do enorme preço que é praticado. Trata-se, portanto, de uma questão governamental e urbanística.
As mudanças necessárias não são apenas, nem sobretudo, das montadoras, mas de toda uma cultura, uma nação. Já existem veículos elétricos disponíveis no Brasil, mas além de caros, a infraestrutura para carregar as baterias, por exemplo, é ínfima por parte do setor público. Cada proprietário precisa ter sua própria fonte de abastecimento elétrico. Como, porém, fazer uma viagem distante sem ter onde carregar as baterias?
Com todas essas mudanças acontecendo, e numa velocidade tão grande, o futuro da mobilidade urbana está prestes a mudar de cara. Antigamente dirigir era um grande prazer do brasileiro. Hoje, com as centenas de quilômetros de congestionamento, vias deterioradas, pontes que caem ou são interditadas, dirigir está cada vez mais sendo uma tortura.
Não faz mais sentido uma tonelada de ferro transportar apenas uma pessoa. A tendência a médio prazo é de que o carro deixe de ser um bem de consumo para passar a ser um serviço. Poucas pessoas ou empresas terão carros para levarem muitas pra determinado lugar. A Uber é claro e real exemplo disso.
O carro voltará, de certa forma, a ser um artigo de luxo. Mais ou menos como uma pessoa que tem um cavalo na fazenda para andar de quando em vez, assim as pessoas terão carro para uma ou outra viagem. Mas o futuro da mobilidade urbana irá mudar.