No Brasil, o automóvel sempre foi um símbolo de maturidade, status e autonomia desde que chegou ao país, em 1891, ao chegar na idade certa é hora de tirar a carteira de habilitação, baixar a CNH Digital e sair por aí, mas isso está mudando.
Essa imagem idílica do carro como um rito de passagem para a vida adulta está sendo redefinida à medida que os jovens brasileiros demonstram um declínio acentuado no interesse em obter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e possuir carros próprios. Uma série de fatores, incluindo a crise econômica, os custos associados à propriedade de um veículo e a ascensão dos aplicativos de transporte, está moldando essa mudança de paradigma.
O presidente da Federação Nacional das Autoescolas e Centro de Formação de Condutores (Feneauto), Wagner Prado, relata que a procura pela CNH entre os jovens vem diminuindo significativamente. Ele observa que “muitos jovens não consideram mais a CNH uma prioridade”. Esse fenômeno começou a se intensificar em 2015, coincidindo com o agravamento da crise econômica e o surgimento dos aplicativos de transporte pago ou compartilhado.
Vários motivos são apontados para essa mudança de atitude em relação à obtenção da CNH e à propriedade de carros.
A história de Aghata Ingridi de Sousa Sampaio, uma universitária de 22 anos, é um exemplo de como os jovens estão repensando a necessidade de possuir um carro e uma CNH. Quando ela estava prestes a completar 18 anos, seu pai ofereceu-se para pagar sua autoescola. No entanto, Aghata optou por se mudar para Foz do Iguaçu para cursar a faculdade, onde utilizava a bicicleta e o transporte público para se locomover.
Mesmo após retornar a Brasília para concluir seus estudos em geografia, Aghata continua a preferir alternativas ao carro próprio. Ela compartilha que “não quero ter carro para não expor outras pessoas a riscos, me expor a engarrafamentos, ter que pagar todas as despesas. Também acho que é uma questão de consciência.”
A falta de qualidade do transporte público desempenha um papel fundamental nas decisões dos jovens. Aghata menciona que o transporte público pode ser cansativo, mas ainda é mais conveniente do que enfrentar o trânsito de Brasília. A insatisfação com o transporte público também motiva os jovens a buscar alternativas.
Wagner Prado, presidente da Feneauto e proprietário de um centro de formação de condutores, destaca que exemplos como o de Aghata estão se tornando cada vez mais comuns e isso está afetando diretamente as autoescolas. Muitas estão reduzindo funcionários e a frota de veículos devido à diminuição da demanda por CNHs.
No Distrito Federal, a emissão de CNHs tem diminuído ano a ano desde 2015, atingindo principalmente os condutores de 18 a 24 anos, com uma retração de 45% nessa faixa etária em relação a 2015.
A Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Economia do Ministério da Economia vê como uma tendência a diminuição do interesse pela propriedade de automóveis e um aumento na procura por compartilhamento de veículos e soluções alternativas, como bicicletas e patinetes, nos próximos cinco anos.
No entanto, a mudança de comportamento dos jovens não está refletida diretamente no Programa Rota 2030 – Mobilidade e Logística, a política industrial para o setor automotivo. A pasta lembra que, pelos próximos cinco anos, os consumidores mais jovens “ainda deverão ter participação significativa no mercado dos veículos tradicionais.”
Uma pesquisa anterior apresentada pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) em 2018 analisou a relação das diferentes gerações com a mobilidade. Os resultados foram considerados “surpreendentes” pelo então presidente da Anfavea, Antonio Megale.
A pesquisa revelou que apenas 23% dos jovens com até 25 anos possuíam carro, enquanto entre os entrevistados de 26 a 35 anos, o percentual era de 39%. Além disso, 30% dos mais jovens afirmaram não ter interesse em adquirir um veículo automotivo. Isso indica uma clara tendência de preferir alternativas de transporte.
*Com informações da Agência Brasil, CNN e Câmara.