Sentado no meu escritório, rodeado por miniaturas de carros clássicos brasileiros, me pego pensando: o que aconteceu com as montadoras 100% nacionais? Gurgel, Puma, Troller… nomes que uma vez simbolizavam a inventividade e a coragem industrial brasileira agora são apenas lembranças nostálgicas em exposições de carros antigos ou conversas entre entusiastas. Este cenário me leva a uma reflexão mais profunda e, admito, um tanto cômica sobre os desafios que encerraram o sonho de muitos empresários automotivos no Brasil.
No início, a ideia de criar e fabricar carros inteiramente no Brasil era não apenas uma visão, mas uma manifestação de independência tecnológica. Empreendedores como João Gurgel não apenas sonhavam, mas colocavam a mão na massa, ou melhor, na fibra de vidro. No entanto, rapidamente perceberam que o caminho para transformar sonhos automotivos em realidade era mais acidentado que qualquer teste drive em estradas brasileiras não pavimentadas.
A primeira grande barreira sempre foi econômica. Em um país onde a instabilidade financeira parece ser a única constante, investir em uma indústria que requer capital intensivo é mais arriscado que apostar em corridas de demolição. Altos impostos e a falta de incentivos específicos para montadoras nacionais colocam em xeque a viabilidade de qualquer empresa que queira começar do zero.
Outro desafio é a competição global. À medida que o Brasil se abriu para o mercado internacional nos anos 90, marcas estrangeiras com décadas de experiência e tecnologia avançada inundaram o mercado. Competir com gigantes automotivos estabelecidos exigiria um investimento em pesquisa e desenvolvimento que ultrapassava os cofres das iniciativas nacionais.
A tecnologia, claro, é outra grande protagonista desta história. Em um setor que evolui a passos largos, acompanhar as inovações em eficiência energética, segurança veicular e design torna-se um desafio titânico. As montadoras nacionais, muitas vezes limitadas por recursos mais modestos, lutavam para oferecer o mesmo nível de inovação que os consumidores poderiam encontrar em modelos importados.
Além disso, o próprio mercado brasileiro é um enigma. A demanda por veículos é influenciada por tantos fatores – econômicos, políticos, sociais – que prever o sucesso de uma montadora nacional é tão difícil quanto acertar os números da loteria. E mesmo quando há demanda, as preferências dos consumidores podem ser difíceis de decifrar.
Neste contexto, as montadoras brasileiras, apesar de seu valor histórico e de suas contribuições tecnológicas, começaram a enfrentar dificuldades crescentes. As poucas que sobreviveram o fizeram muitas vezes por se adaptar a nichos específicos, como a Troller com seus robustos off-roaders.
O fim dessas montadoras é também um reflexo de um ambiente de negócios que, muitas vezes, parece favorecer o grande em detrimento do pequeno, o estrangeiro em detrimento do local. Não é uma questão de qualidade ou de capacidade, mas de escala e apoio.
Por fim, apesar desses desafios aparentemente intransponíveis, a chama do empreendedorismo automotivo no Brasil não se extinguiu completamente. Novos projetos e startups surgem, tentando reinventar o conceito de mobilidade nacional com foco em sustentabilidade e inovação, como veículos elétricos e soluções de mobilidade urbana.
No entanto, até que sejam encontradas soluções eficazes para os desafios estruturais e econômicos que enfrentamos, a jornada para reviver a produção automotiva 100% nacional será uma estrada longa e cheia de buracos. E enquanto isso, nos resta a nostalgia e a esperança de que um dia, marcas como Gurgel e Puma possam inspirar novas gerações a reinventar a indústria automotiva brasileira.
Algumas marcas de carros 100% brasileiras que fizeram sucesso ao longo dos anos incluem essas principais.
*Com informações do UOL, Wikipedia, Super e Noticiasautomotivas.