
O governo decidiu atacar de frente um dos gargalos mais caros e lentos da vida adulta no Brasil, tirar a Carteira Nacional de Habilitação. A mudança em discussão simplifica etapas, derruba a exclusividade das autoescolas e abre espaço para cursos gratuitos, inclusive online.
O ministro dos Transportes, Renan Filho, expôs o tamanho do problema, em algumas regiões, o candidato paga até R$ 5 mil para concluir o processo, que pode se arrastar por 9 meses. Para quem precisa da habilitação para trabalhar ou estudar, esse formato virou barreira real.
O plano “CNH sem autoescola” passa por dois eixos, redução de custos e flexibilização da formação. A ideia é oferecer cursos gratuitos de preparação, por meio do Ministério dos Transportes e dos Detrans, com possibilidade de aulas online e em escolas públicas.
A proposta não extingue as autoescolas, mas tira delas a obrigatoriedade da formação prática. O candidato poderá negociar diretamente com instrutores autônomos certificados, usando até o próprio carro, desde que esteja identificado de forma adequada.
Segundo o ministro, parte da resistência vem dos donos de autoescolas, que veem nas mudanças o fim de uma reserva de mercado. Renan Filho sustenta que, em qualquer setor, monopólios tendem a empurrar os preços para cima e afastar o consumidor.
O governo quer aproveitar a estrutura das redes de ensino para oferecer o conteúdo teórico da CNH. Em vez de concentrar toda a preparação nas autoescolas, disciplinas como legislação de trânsito, cidadania, direção defensiva e meio ambiente podem entrar na rotina das escolas.
Hoje, quem tenta habilitação para carro e moto encara 45 horas de curso teórico, mais 20 horas de prática para moto e outras 20 para carro, um total de 85 horas. Se o aluno conseguir se dedicar 2 horas por dia, são mais de 40 dias até concluir apenas essa etapa, sem contar prova escrita e remarcações.
O Ministério dos Transportes levantou que 54% dos CPFs que compraram motocicletas não têm habilitação. Em alguns estados, esse índice chega a 70 por cento. A partir desses números, o governo estima que cerca de 20 milhões de brasileiros dirigem sem carteira.
A aposta é que, com custo menor e processo menos burocrático, mais gente decida se regularizar. Para o ministério, isso se traduz em mais segurança no trânsito e em uma relação mais transparente entre Estado e condutor.
Um dos efeitos colaterais das mudanças é a criação de um mercado mais aberto para instrutores. De acordo com o governo, hoje o país já conta com cerca de 200 mil profissionais aptos a dar aulas, número que pode aumentar com novos credenciamentos pelos Detrans e pelo próprio ministério.
Sem a intermediação obrigatória das autoescolas, esses instrutores poderão negociar diretamente com os candidatos. A lógica é simples, se mais pessoas passarem a buscar a CNH, será preciso mais gente ensinando, em mais formatos e locais.
Segundo a Agenciabrasil, a regulamentação final depende de uma resolução do Contran, prevista para este ano, após o encerramento das audiências públicas, que recebem contribuições da sociedade até 2 de novembro. Um dos pontos em aberto é se haverá exigência de carga horária mínima de prática, mesmo com o novo modelo.
Se a proposta avançar como está sendo desenhada, tirar a carteira de motorista deixa de ser um percurso caro e quase exclusivo de quem consegue bancar meses de aulas em autoescolas, e passa a ser um serviço mais distribuído entre Estado, escolas e instrutores independentes.